Estudante com tetraparesia aprende a ‘falar’ com os olhos e se forma em Medicina no Paraná

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Em 2014, enquanto cursava o terceiro semestre de Medicina, a estudante universitária Elaine Luzia dos Santos, 33 anos, sofreu um AVC (acidente vascular cerebral) que a fez perder os movimentos das pernas e braços.

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Mais tarde, Elaine foi diagnosticada com tetraparesia, uma condição na qual todos os quatro membros experimentam fraqueza anormal, por causa de danos aos nervos ou porque os músculos não funcionam normalmente.

Como resultado da anomalia, a estudante da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (Unioeste) sentiu que o sonho do diploma estava mais distante. No entanto, sua força de vontade e extraordinária capacidade de superação a fizeram continuar estudando.

Com o passar dos semestres, Elaine aprendeu a se comunicar apenas piscando os olhos e está a menos de 1 mês de se tornar a primeira médica formada na Unioeste com tetraparesia, já que em maio está marcada sua colação de grau.

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Basta uma piscada, um olhar ou movimento sutil para Elaine se comunicar com pacientes, amigos, familiares, professores ou seus colegas de turma, que também se adaptaram para aprender a traduzir o significado de cada gesto.

O caminho para a comunicação efetiva foi árduo, mas a futura médica soube superar cada dificuldade.

A paranaense de Diamante D’Oeste já é formada em Fármacia, e ingressou no curso de Medicina em 2012, no campus de Cascavel, no interior do Paraná. “Decidi fazer por vontade de experimentar novas formas de ajudar os outros”, contou.

O AVC abrupto que sofreu em novembro de 2014 ocasionou na perda dos movimentos e da fala, uma condição da tetraparesia. Desde então, sua rotina familiar e seu círculo social precisaram se reinventar.

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O primeiro passo foi a mudança de endereço. Os pais de Elaine – a funcionária pública Dalva Alves dos Santos, 66 anos, e o aposentado Josué Barbosa dos Santos, 71, – deixaram Diamante D’Oeste para viverem com a filha em Cascavel.

“A rotina é uma correria. Temos que acordar muito cedo mesmo para levar ela na faculdade. Além disso temos que dar água, levar no banheiro, dar comida, a comunicação é lenta porque ela soletra todas as palavras, não é fácil. Mas ela é muito resistente, ela pensou, ‘estou com um sonho de fazer medicina, o que a senhora acha?’ e eu falei, ‘minha filha, o sonho é seu’”, assegurou Dona Dalva, que tem outros 6 filhos.

Prancha alfabética

Enquanto se recuperava do acidente vascular cerebral na UTI, Elaine descobriu através de um colega de turma a chamada “prancha alfabética”, ferramenta que hoje possibilita que ela fale e se expresse sem sequer utilizar as cordas vocais.

A prancha consiste basicamente em uma tabela com 5 linhas – cada qual contendo um conjunto de letras. Assim, para formar palavras e frases, a paranaense pisca quando a intérprete diz a letra necessária para a construção daquilo que ela deseja comunicar.

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Com a intensificação do uso da ferramenta, eles fizeram algumas alterações para otimizar e facilitar o processo de formação do pensamento de Elaine.

Caminho rumo ao diploma

A estudante retornou à faculdade em setembro de 2015, quase um ano após o AVC.

De início, enfrentou resistência por parte de algumas pessoas do curso, que acreditavam ser impossível que ela se reinserisse na rotina de estudos. Felizmente, eles estavam enganados.

Segundo Elionésia Marta dos Santos, irmã da futura médica, ela colocou desde cedo como objetivo completar a graduação iniciada.

“Assim que ela saiu do hospital, ela entrou em férias e já demonstrou uma preocupação em como ficariam as disciplinas para ela finalizar o terceiro ano, e ela queria já finalizar, na expectativa que ela tivesse uma melhora”, lembrou.

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Com o apoio da universidade, através do PEE – Programa de Educação Especial, – o processo de retorno de Elaine foi acompanhado de perto.

“Fizemos algumas reuniões com o Colegiado e mostramos que ela tinha condições de concluir esse curso. A dedicação dela mostrou que era possível, inclusive convenceu a todos os docentes e os alunos do curso que é possível”, explicou o educador Ivã José de Paula.

Ao mesmo tempo, o colegiado buscou experiências com outras universidades que possuem estudantes com condições semelhantes, e trabalhou para facilitar a inclusão da estudante.

“Nós fomos atrás de ver essas experiências, mas elas praticamente inexistem, são poucas no mundo com alunos de Medicina. Então, nós mesmos teríamos que ir atrás para resolver a situação”, comentou Allan Araujo, coordenador do curso de Medicina da Unioeste.

Por fim, os procedimentos de avaliação de Elaine foram remodelados.

“Existe uma legislação própria para alunos em condições especiais, onde você não pode cobrar algo que ele não vai conseguir utilizar. A Elaine, por exemplo, não tinha condições de fazer um procedimento em um paciente, mas ela possui total capacidade de descrevê-lo. E as avaliações dela sempre foram muito boas, o aproveitamento dela foi muito satisfatório durante toda a graduação”, disse Allan.

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Especialização

Prestes a ser oficializada como médica, Elaine já escolheu a área em que deseja se especializar: radiologia, com foco na produção de laudos médicos.

“Por ser uma área que eu possa atuar usando todo o meu conhecimento sem depender tanto das pessoas”, disse.

De 2014 pra cá, uma das coisas que mais marcou a estudante foi a relação que teve com os pacientes durante as aulas práticas e os estágios. “O que mais chamou atenção foi o carinho com que os pacientes me tratam. Eles me incentivam todos os dias a continuar”, comentou.

Inspiração para todos

Para as pessoas mais próximas de Elaine, ela é uma inspiração por si só, já que lutou incansavelmente para realizar seu sonho.

“Ela não sente o tamanho da proporção, a gente ficou no pé dela falando para mostrar a história dela porque é incentivadora, mas para ela é normal, ela escolheu ser normal”, frisou Isabella Alves Pereira, cuidadora da estudante.

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“Vimos que para Elaine seria suficiente desenvolver atividades na Enfermaria e ficar meio período, sendo dispensada das ações no Centro Cirúrgico. Mas para nossa grata surpresa, ela não queria nada disso. A gente até se emociona com isso. Ela nunca pediu nada especial e com adaptação teve Elaine no Centro Cirúrgico, no Ambulatório. Ela fez aquilo que ela queria”, afirmou Allan Araujo, coordenador do curso de Medicina da Unioeste.

“A Elaine foi muito além da sua obrigação. Ela se desafiou. E também foi um desafio para nós, que aprendemos muito com ela. A Elaine não coloca limite, ela quer participar de tudo e isso nos deu um grande exemplo”, completou.

Fonte: O Presente
Fotos: ACS Unioeste / Arquivo pessoal

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