Aos 25 anos de idade, Hermerson Pataxó se arrumou com cocar, colar e rosto pintado para receber o título de mestre pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Ele é o primeiro estudante indígena a conquistar tal honraria em um curso das Ciências Exatas da instituição.
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Agora mestre em Química Orgânica, o jovem, bastante emocionado, não conseguiu ler por completo a dedicatória ao seu povo: os Pataxó Hã Hã Hãe: “Agradeço à minha família pelo incentivo, apoio e por sempre acreditar no sucesso de minhas escolhas e ao meu povo por lutar e resistir para que possamos escrever histórias como essa”.
No discurso, lembrou que sua origem não estava apenas no sangue, mas nos símbolos que utiliza. Foi às lágrimas e a emoção tomaram conta do pesquisador. Após cerca de duas horas de perguntas dos avaliadores, e já com o título garantido, Hemerson esclareceu seus motivos.
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“É muito forte para mim falar disso, me emociona. Mas sempre agradeço ao meu povo porque eu sou eles. Eu estou aqui, mas eu estou lá também. E eles estão aqui comigo”, contou.
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A tribo de Hemerson vive em uma aldeia a 9 horas de ônibus de Salvador, capital baiana. É preciso ir até Itabuna e dessa cidade até Pau Brasil (o município mais próximo da aldeia indígena) para chegar até os Pataxó Hã Hã Hãe – isso após percorrer um terceiro trecho à pé.
O químico saiu de lá quando tinha 18 anos. Ele havia sido aprovado no vestibular de química na Universidade Estadual de Santa Cruz (Uesc). Os anos de estudo no ensino fundamental e médio foram feitos ainda na aldeia, e é um dos motivos que levaram Hemerson a escolher portar os símbolos culturais para defender sua dissertação de mestrado.
“O cocar simboliza proteção, o colar vermelho e preto, tem essas cores que são muito fortes na cultura indígena. A pintura também. Ao mesmo tempo que significa a gratidão pelo meu povo, simboliza também o guerreiro, a resistência por estar aqui, ocupando esse espaço”, explica ele.
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Para ele, permanecer na instituição sempre sempre lhe foi um desafio. “É muito difícil para os indígenas permanecerem aqui, tanto pelo aspecto financeiro, quanto pela questão da base que muitos não têm. Tem coisa que você não conhece, que você vai aprendendo à medida em que elas vão se apresentando para você e é preciso aprender para continuar”.
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Esse choque de cultura foi algo que marcou bastante o início da carreira acadêmica do rapaz. “No meu povo existem condições sociais diferentes, mas todo mundo tem o seu cantinho. Quando cheguei na cidade e vi um morador de rua foi um susto”, contou, ao ilustrar as diferenças.
Outro aspecto cotidiano que o agora químico teve que enfrentar nos anos de curso foi a generalização feita por aqueles que não eram índios. “No começo, todo mundo me chamava de índio, mas eu tenho um nome, eu sou Hemerson. Aos poucos eles foram entendendo que nem todo inidio anda nu, que nem toda casa é de barro. A minha comunidade mesmo tem mais várias décadas de contato com a população não indígena. Tem índio lá que dirige, tem celular”, contou.
Quando entrou na pós-graduação, suas origens indígenas eram apenas um detalhe para a equipe que conviveu com o graduando. Por dois anos, ele estudou o café da Chapada Diamantina, objeto de sua especialização.
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“Já tínhamos trocado alguns e-mails, mas foi só na nossa primeira conversa presencial que ele chegou com um dos braços pintados e eu percebi que ele era indígena. Isso não mudou nada, ele é muito competente, metódico até, e fez um trabalho que merece o resultado que vimos hoje aqui”, conta a professora Elisangela Fabiana Boffo, doutora em química orgânica, professora da Ufba e orientadora do trabalho. Ela foi uma das responsáveis por conceder a Hemerson o título de mestre com distinção.
Agora, o mestre em química pretende unir a ciência com o conhecimento milenar do seu povo. “Quero levar o conhecimento que a química me deu para o meu povo, juntar com o que sabem os meus anciãos e escrever algo que leve em conta os dois lados”, explica.
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Fonte: Correio 24h
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