O jovem estudante brasileiro Luiz Fernando da Silva Borges tem pouca idade mas já coleciona grandes conquistas dentro da neuroengenharia. Aos 18 anos, ele já havia criado um braço robótico que restaura a sensibilidade tátil e agora está desenvolvendo o Hermes Braindeck, um dispositivo de comunicação para pessoas em coma ou em estado vegetativo, que funciona através de sua atividade cerebral. Parece loucura, mas são apenas as maravilhas da ciência mesmo.
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O complexo trabalho do estudante de Aquidauana, no Mato Grosso do Sul, tem chamado a atenção da comunidade científica. No ano passado, foi premiado na Intel Isef 2017 (Intel International Science and Engineering Fair), a maior feira pré-universitária de ciências do mundo, pela criação de uma prótese inovadora, capaz de recuperar o tato e o movimento dos dedos e do punho. Mas ele já era um veterano nas participações. “A primeira vez foi em 2015, com a versão mais barata e melhorada de um equipamento existente no mercado (termociclador) para amplificação de DNA, que torna possível detectar vírus, fazer testes de paternidade e análises forenses criminais”, explicou em entrevista ao Razões para Acreditar.
A versão, aprimorada pelo adolescente, foi feita com materiais alternativos por R$ 850,00 – custo bem menor do que a versão do mercado, de R$40.000,00. Isso foi suficiente para que fosse apontado como tecnologia inovadora para o desenvolvimento das Américas, concedido pela Associação dos Estados Americanos OEA.
Na terceira vez em que esteve na feira, porém, levou um prêmio pelo projeto apresentado e de quebra teve a nomeação de um asteroide em sua homenagem, concedido pelo Lincoln Laboratory, do MIT, que é a melhor universidade de engenharia do planeta. “Em cerca de 30 anos de participação do Brasil nesta feira, foi a primeira vez que tais resultados foram atingidos. Esse ano só não recebo outro asteroide porque essa é uma honra que só se recebe uma vez, mas por minha premiação de 2017 eu também conseguiria”, orgulhou-se.
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O mais curioso é que o projeto de Luiz, totalmente original e considerado o melhor do mundo na área de engenharia biomédica, veio de um insight baseado nas pesquisas do professor brasileiro Miguel Nicolelis sobre interfaces cérebro-máquina (fazendo com que uma pessoa com paralisia desse o primeiro chute da copa do mundo de 2014) e de um episódio da série House sobre membros fantasma. “Isso me fez criar uma nova metodologia, um novo método para transformar sinais elétricos musculares em comandos motores para uma prótese robótica”.
Como se tivesse um bocado de mágica no meio, o método extrai sinais elétricos musculares do coto de uma pessoa amputada abaixo do cotovelo, convertendo-os para o controle direto, independente e contínuo das dez articulações da mão humana, permitindo a realização de tarefas como a digitação em um computador. “Depois disso, criei uma versão virtual de um truque muito famoso de festas, ou de mágica, chamado ‘Ilusão da mão de borracha’, para reinserir no cérebro dos amputados a noção de novamente sentir sensações como temperatura, textura e força em um braço que eles perderam”.
Com a premiação deste ano, 2017, o aluno do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Mato Grosso chegou a marca de 63 prêmios de feira de ciências, o que abrilhanta ainda mais seu currículo científico.
Ciência em nome da bisavó
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Enquanto estava no ensino fundamental, Luiz já demonstrava interesse em se envolver com pesquisas médicas, mas não havia suporte suficiente. Quando a idade avançou, cursou ensino médio integrado com o ensino técnico e mergulhou de cabeça nas atividades propostas. “Por causa das disciplinas do curso, aprendi ferramentas como a programação e robótica, que foram as bases que me fizeram capaz de conduzir minhas pesquisas na área da neuroengenharia e podem ser empregadas para a solução de problemas da área médica.”
Depois aprofundou os estudos no conceito de cérebro-máquina, que é basicamente um conjunto de métodos para extrair sinais elétricos do cérebro, enviá-los para um programa de computador que os decodifica e transformá-los em comandos motores. Tais inferfaces incentivam o último projeto, o dispositivo portátil Hermes Braindeck, que detecta se uma pessoa consegue responder a comandos apenas usando seus pensamentos.
Mas a maior motivadora mesmo dessa ferramenta foi sua bisavó, que ficou em coma por quase um mês antes de falecer. Durante as visitas no hospital, a tia de Luiz relatou que a paciente chorava quando ouvia sua voz. “Com isso, eu percebi que o mesmo princípio de cérebro-máquina poderia ser usado para a comunicação com pessoas que aparentam estar em um estado vegetativo ou coma, mas na verdade estão apenas incapazes de movimentar qualquer músculo, inclusive os responsáveis pela fala e movimento dos olhos”.
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O atual método usado para medir a consciência de pessoas nesses estados, chamado Escala de Coma de Glasgow, está um tanto ultrapassado, pois foi desenvolvida nos anos 1970 e não avalia certas complexidades individuais, que foram levadas em consideração pelo projeto de Luiz. “Em alguns casos, o indivíduo está completamente capaz de entender as instruções, mas incapaz de realizá-las, fazendo com que pensem que este se encontra inconsciente. Uma ferramenta que analise o nível de responsividade a nível da atividade cerebral seria essencial para uma classificação mais acurada da responsividade destes tipos de pacientes”.
Por enquanto, o Hermes Braindeck foi testado apenas em voluntários despertos instruídos a agirem como se estivessem em coma, devido restrições da legislação brasileira. Devido ao alto índice de acerto do programa em decodificar os pensamentos dos voluntários, a pesquisa foi inscrita para a avaliação ética de um comitê que verificará a possibilidade de sua aplicação em pacientes inicialmente classificados em estado vegetativo e coma.
O futuro baseado em neurônios
A nova invenção, assim como as demais, destaca o potencial da nossa massa cinzenta, objeto de fascínio para Luiz. “Com certeza o que vamos observar na próxima década é o surgimento de negócios que orbitarão ao redor do cérebro, tanto em matéria de gadgets que usarão sinais biológicos como os cerebrais e musculares para o controle de celulares e computadores; tanto como programas moldados de acordo com princípios básicos do funcionamento cerebral. Só devemos tomar cuidado com muitos projetos que temos hoje que não passam de marketing barato. Eles colocam o prefixo “neuro” e vendem como se fosse algo baseado em estudos científicos sérios, mas tudo não passa de neuropicaretagem, como “neuromúsica, neurocoaching, neuromassagem”…o céu é o neurolimite”, debochou.
Falando em neuros, ao contrário do que podemos pensar, o jovem cientista afirma que utilizamos sim 100% de nosso cérebro o tempo todo. Porém, alerta para a forma como estamos – ou não – o usando. “Um fenômeno muito presente nos dias atuais é a perda de nossa capacidade de reter informações simples. Há algumas hipóteses que pregam que, na verdade, nosso cérebro está enxergando gadgets como celulares e computadores como uma extensão de sua capacidade de armazenamento, portanto, ele não aloca mais espaço neuronal para tanto. Tenho 19 anos e já consigo observar o quanto alguns de meus colegas preferem morrer à praticar alguma atividade que dependa de habilidades verbais expositivas e eloquência. Parece que só sabem falar por texto, nem telefonemas não gostam de fazer, e isso que é realmente preocupante. Talvez a constante interação com estas tecnologias faça com que passemos a usar menos de 100% de nossa capacidade.”
Com tanta constatação, descobertas e prêmios em mãos, Luiz é mais um dos jovens inteligentes e interessados que precisam de apoio para concretizarem seus projetos no Brasil, rumo aos avanços da ciência. “O fato de eu ter feito grande parte da pesquisa com 17, 18 anos já é o primeiro problema para a academia brasileira que é baseada em um sistema de castas que pontua cientistas pelo volume de suas publicações científicas (e não de sua qualidade). Isto explica o baixo impacto que certos setores da academia brasileira têm em um cenário mundial de produtividade. Não damos atenção a ideias, e sim a nomes, quase nos assemelhamos a um sistema religioso”, argumentou.
Ainda assim, os planos de seguir em frente não serão deixados de lado, na esperança de que o país consiga superar, entre tantas crises, a de reprodutibilidade. “Minha ambição para os próximos 10 anos é ser um pesquisador na vanguarda da neuroengenharia, dirigindo um grande laboratório com diversas pesquisas acontecendo. Quero investigar formação de memórias e como podemos transplantá-las ou até mesmo estudar a interação em tempo real de cérebros buscando a solução de um problema. Apesar da pesquisa, não penso em deixar o empreendedorismo de lado, não vou descansar enquanto não ver brasileiros sendo os primeiros a se beneficiarem com a tecnologia da Hermes Braindeck”, concluiu.
Fotos: divulgação/acervo pessoal
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